Sexta-feira, 12.03.10






E eu fico me perguntando: até que ponto perdoar e esquecer é uma alternativa possível?
Hannah Arendt – teórica política judia perseguida pelo nazismo – fala da diferença entre perdoar e compreender. Para ela, perdoar é fazer o impossível: é praticamente desfazer o que foi feito, mas sem eliminar a consciência de que aquilo de fato ocorreu. Já compreender é entender que tal atitude é válida, dadas as circunstâncias. Assim, ela mesma dizia perdoar o nazismo, mas nunca compreendê-lo, pois compreender tamanha atrocidade seria reconhecer o mundo onde o nazismo existe como aceitável.
Tanto compreender quanto perdoar são ferramentas de crescimento e evolução pessoal, espiritual, filosófica, transcendental (escolha aí o nome que mais lhe apetece), desde que sejam puxadas do nosso “cinto de utilidades” na hora certa.
Perdoar não é fácil. Ou melhor! Perdoar não é difícil! Difícil é chegar a esse estado de espírito que permite o perdão. Uma vez que se chegue lá, é muito natural e faz mais bem a quem perdoa do que a quem é perdoado. Alivia os pesos da alma, retira de nós uma bagagem que em nada nos seria útil. E perdoar não é esquecer, porque quando perdoamos, a lembrança continua conosco como aprendizado, mas não como mágoa.
Compreender é exercer a empatia no seu grau mais elevado e ir além: é estar disposto a sair da zona de conforto e mudar o “ponto de observação”. É calçar os sapatos do outro percebendo suas motivações e suas angústias. É ganhar uma nova perspectiva – algo que só nos enriquece, mas que demanda um esforço que quase ninguém está de fato disposto a fazer.
De qualquer forma, vejo tantas mulheres se esforçando para compreender e perdoar toda sorte de atitudes vindas do amado da vez… Mas, a mesma mulher, capaz de tamanha compaixão, não perde muito tempo tentando compreender uma amiga, uma pessoa da família ou um colega de trabalho que pisou na bola.
Mas o único risco que corremos ao fazer o esforço de TENTAR compreender um amigo é o de abandonarmos um monte de bobagens que julgávamos imprescindíveis.
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As relações familiares, em sua grande maioria, têm origem em um elo de afetividade. Surgem de um enlaçamento amoroso. A essa realidade evidente por si só cabe questionar, afinal, por que as relações afetivas migram para a violência em números tão chocantes e surpreendentes? O mais intrigante é que nem sempre é por necessidade de sustento ou por não terem condições de prover sozinhas a própria existência que as mulheres se submetem, calam e não denunciam as agressões de que são vítimas.










Por que as mulheres sofrem em silêncio? Medo, vergonha, temor da incompreensão, sentimento de incapacidade, de impotência, tolerância à submissão, desrespeito a si próprias? Mas essas são as causas da violência ou são os motivos do silêncio?

O desejo do agressor é submeter a mulher à vontade própria, é dominar a vítima, daí a necessidade de controlá-la. Para isso, busca destruir sua auto-estima. As críticas constantes fazem ela acreditar que tudo que faz é errado, de nada entende, não sabe se vestir nem se comportar socialmente. É induzida a acreditar que não sabe administrar a casa nem cuidar dos filhos. A alegação de não ter um bom desempenho sexual leva ao afastamento da intimidade e à ameaça de abandono.

O silêncio passa à indiferença e às reclamações, reprimendas, reprovações. Depois vêm os castigos, as punições. Os gritos transformam-se em empurrões, tapas, socos, pontapés, num crescer sem fim. As agressões não se cingem à pessoa da vítima. O varão destrói seus objetos de estimação, a envergonha em público, a humilha diante dos filhos. Sabe que eles são o seu ponto fraco e os usa como massa de manobra, ameaçando maltratá-los.

Para dominar a mulher, procura isolá-la do mundo exterior, afastando-a da família. Proíbe as amizades, denigre a imagem dos amigos. No entanto, socialmente, o agressor é agradável, encantador. Em público se mostra um belo companheiro, a não permitir que alguma referência a atitudes agressivas mereça credibilidade.

Muitas vezes impede a esposa ou companheira de trabalhar, levando-a a se afastar de pessoas junto às quais poderia buscar apoio. Subtrai a possibilidade de ela ter contato com a sanidade e buscar ajuda. O medo da solidão a faz dependente e sua segurança resta abalada. A mulher não resiste e se torna prisioneira da vontade do par, o que gera uma situação propícia a uma verdadeira lavagem cerebral, campo fértil para o surgimento do abuso psicológico.

Assim, facilmente a vítima encontra explicações, justificativas para o comportamento do parceiro. Acredita que é uma fase, que vai passar, que ele anda estressado, trabalhando muito, com pouco dinheiro. Procura agradá-lo, ser mais compreensiva, boa parceira. Para evitar problemas, afasta-se dos amigos, submete-se à vontade do agressor, só usa as roupas que ele gosta, deixa de se maquiar para não desagradá-lo. Está constantemente assustada, pois não sabe quando será a próxima explosão, e tenta não fazer nada errado. Fica insegura e, para não zangar o companheiro, começa a perguntar a ele o que e como fazer, torna-se sua dependente. Anula a si própria, seus desejos, sonhos de realização pessoal, objetivos próprios.

O agressor sempre atribui a culpa à mulher, tenta justificar seu descontrole na conduta dela, suas exigências constantes de dinheiro, seu desleixo para com a casa e os filhos. Alega que foi ela quem começou, pois não faz nada certo, não faz o que ele manda. Ela acaba reconhecendo que ele tem razão, que em parte a culpa é sua. Assim o perdoa. Para evitar nova agressão, recua, deixando mais espaço para a agressão.



Nesse momento a mulher vira um alvo fácil. A angústia do fracasso passa a ser seu cotidiano, questiona o que fez de errado, sem se dar conta de que para o agressor não existe nada certo. Não há como satisfazer o que nada mais é do que desejo de dominação, de mando, fruto de um comportamento controlador.

Depois... vem o arrependimento, pedidos de perdão, choro, flores, promessas. A vítima acredita que ele vai mudar e se sente protegida, amada, querida. As cenas de ciúmes são recebidas como prova de amor, e ela fica lisonjeada.

Tudo fica bom até a próxima cobrança, ameaça, grito, tapa...

Forma-se um ciclo em espiral ascendente que não tem mais limite.

O homem não odeia a mulher, ele odeia a si mesmo. Muitas vezes ele foi vítima de abuso ou agressão e tem medo, precisa ter o controle da situação para se sentir seguro. A forma de se compensar é agredir.

A sociedade protege a agressividade masculina, constrói a imagem da superioridade do homem. Afetividade e sensibilidade não são expressões da masculinidade. O homem é retratado pela virilidade. Desde o nascimento, é encorajado a ser forte, não chorar, não levar desaforo para casa, não ser “maricas”. Os homens precisam ser super-homens, não lhes é permitido ser apenas humanos.

A idéia da família como uma entidade inviolável, protegida da interferência até da Justiça, faz com que a violência se torne invisível.

A violência é protegida pelo segredo; agressor e agredida fazem um pacto de silêncio, que o livra da punição. Estabelece-se um verdadeiro ciclo, a mulher não se sente vítima, o que faz desaparecer a figura do agressor. Mas o silêncio não gera nenhuma barreira. A falta de um limite faz com que a violência se exacerbe. O homem testa seus limites de dominação. Quando a agressão não gera reação, aumenta a agressividade. O agressor, para conseguir dominar, para manter a submissão, exacerba na agressão.

A ferida sara, os ossos quebrados se recuperam, o sangue seca, mas a perda da autoconfiança, a visão pessimista, a depressão, essas são feridas que não curam.

Por isso, é preciso romper o pacto de silêncio, não aceitar sequer um grito, denunciar a primeira agressão. É a única forma de estancar o ciclo da violência da qual a mulher é a grande vítima.

PS: Prestando um serviço de utilidade pública, vale dizer que em 85% dos casos, só o fato de o agressor ser denunciado e chamado pela polícia a se explicar, já é o bastante para que não volte a agredir. Portanto, no tocante a violência doméstica, perdoar e compreender depende de cada caso. DENUNCIAR É IMPERATIVO A TODOS ELES


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publicado por araretamaumamulher às 05:36 | link do post | comentar | ver comentários (4) | favorito

Quarta-feira, 17.02.10





Nunca peça à vítima para ignorar ou esquecer o que aconteceu. Não se deve pedir às vítimas da violência para simplesmente perdoarem os que as maltrataram, principalmente se a violência ainda continua. A questão do perdão é entre a pessoa e Deus. Ao invés disso, é necessário que se acredite na vítima e que ela possa falar abertamente. A vergonha e a culpa estão entre os sentimentos mais comuns das vítimas da violência doméstica. Elas acham que ninguém as pode compreender. Nunca deixe a vítima pensar que você acredita que ela é culpada pelo que aconteceu.
Para a vitima de violência, admitir que sofre humilhação, maus tratos, e privações, é o mesmo que ficar nua em praça publica expor nossa vida pessoal, é algo muito doloroso, e muitas vezes sentimos ser mais fáceis passar pelo que estamos a passar do que denunciar. O medo, a vergonha, a exposição publica de nossos problemas, é um drama, tão difícil de ser enfrentado quanto os maus tratos.
Admitir para nós seres humanos que não somos os melhores, que fracassamos na escolha de nossos companheiros, que aceitamos apesar de reconhecermos esse fracasso, por muitos anos, ir remediando e suportando a dor e a humilhação, não é uma tarefa fácil.
O sentimento de medo, que beira ao terror, de desonestidade, de culpa em conseqüência do que estamos passando e tão avassalador que nos paralisa totalmente, nos deixa sem ação.
Trata-se de uma defesa emocional, que usamos para nos proteger de mais sofrimentos e dor, de piores tratos e humilhações.
Qualquer mulher que já sofreu abuso emocional ou físico sabe o quanto é dolorido, e como é difícil, expor nossos problemas, porque já sabemos de antemão que vem o julgamento, e o julgamento nunca nos é favorável.
Eu já ouvi tanta coisa do tipo:” E porque você não sai de casa?” “O que você faz para ser tratada dessa forma?” e por ai vai...
Esse tipo de atitude, só nos faz encolhermos ainda mais. E não nos ajuda em nada.
Na verdade, porém, usamos a nossa razão para imaginar desculpas para nosso comportamento patológico que estão de acordo com o que desejamos. Nossas emoções influenciam excessivamente a nossa razão por causa de nossos medos.
Temos dificuldades em fazer distinção entre os sentimentos exagerados do momento da agressão seja ela física ou emocional, e a realidade em longo prazo. E ai começamos a imaginar que somos muito piores do realmente somos na realidade. Misturamos nossos medos e nossa baixa auto-estima, e criamos com toda a certeza um monstro, que pelo poder que damos a ele, vai acabar mesmo nos pegando.
No amor o único bater, autorizado, é o do coração. São pancadas suaves que não deixam marcas, nem resignadas recordações, nada que um simples gesto de ternura não apague.
Não sendo um mal exclusivo das classes mais baixas, hoje se sabe que a violência doméstica não poupa ninguém, não é um problema de classe social, nem de formação acadêmica, são conhecidos os casos de violência é transversal grassa na alta sociedade e o número de casos entre namorados jovens universitários é uma coisa nunca vista.
A formação acadêmica não constitui fator impeditivo destas práticas e, as vítimas por vergonha escondem dos familiares às agressões. A violência doméstica é transversal a toda a sociedade, mas o sofrimento que provoca nas classes com menores recursos é muito maior, porque à violência física se junta à psicológica e a dependência econômica obriga as vítimas a permanecer ao alcance da mão e do chicote dos seus algozes.
No drama da violência doméstica à dureza dos fatos, responde a Justiça com a sua habitual brandura, os autores sentem que podem continuar a alimentar a sua crueldade, impunemente.
Objeto de estudos sucessivos e da repetida necessidade de outros mais pormenorizados, a violência doméstica, passou de consentida a criminosa. O poder marital que permitia matar a mulher adúltera sem conseqüências e o sexo forçado para concretizar o casamento, passaram a ser criminalizados como homicídio e violação. Todavia, a violência doméstica transformou-se num problema social gravíssimo, as medidas para combater este flagelo tem fracassado perante o progressivo aumento deste tipo de criminalidade.
Há quem refira um aumento da violência dos atacantes que à agressão emotiva, juntaram a coativa para condicionarem as vítimas obrigando-as a negar os fatos e a inventar explicações incompatíveis com os ferimentos que apresentam.
Na maioria das culturas, as pessoas escondem o problema da violência dentro da família. Isto significa que pouco se sabe a respeito do nível de violência que afeta as famílias. Os maus-tratos dentro da família têm chamado cada vez mais a atenção dos serviços de saúde, mas são raramente incluídos nos programas comunitários de saúde e educação. Entretanto, a maioria dos casos não são nem mesmo informados. Isto significa que as pessoas que cometem a violência não são responsabilizadas por seus atos. Muitas vezes, elas nem mesmo se dão conta de que cometeram um crime.
No início da década passada, nos Estados Unidos, por exemplo, foram informados um milhão e meio de casos de maus-- tratos contra crianças e adolescentes, com mil mortes por ano. Estima-se que o número real de casos seja 20 vezes maior. Em muitos países em desenvolvimento, o problema é raramente informado.
O termo violência doméstica é usado para descrever qualquer atitude violenta ou negligência dentro da família. As vítimas podem sofrer tudo que é tipo de problemas físicos e mentais – inclusive stress, problemas para dormir, lembranças repentinas do trauma, agressão, isolamento social, comportamento auto-- destrutivo, depressão e fobias. Algumas podem até mesmo cometer suicídio.
A pobreza e a falta de instrução podem aumentar o nível de violência doméstica. Também pode haver outros fatores individuais, familiares, comunitários e sociais. Entretanto, o abuso de poder sobre membros familiares indefesos está sempre presente. As mulheres, os adolescentes, as crianças e as pessoas com deficiência são as vítimas mais freqüentes.
Ajudando as vítimas
O ideal seria que os casos de violência doméstica fossem tratados por profissionais, pois a ajuda inadequada pode causar ainda mais problemas. Entretanto, quando estes não estão disponíveis, os amigos que estiverem dispostos a escutar e oferecer apoio podem ajudar. Ter de testemunhar pode ser prejudicial para a vítima e, mais uma vez, recomenda-se a ajuda especializada, a fim de se minimizarem os danos. Quanto antes os maus-tratos forem identificados e resolvidos, maiores serão as chances de se evitar mais violência e de se tratarem as pessoas violentas com sucesso.
Como os não profissionais podem ajudar?
A princípio, é importante escutar cuidadosamente a vítima e acreditar nela. Acompanha-la a um departamento oficial para expor sua situação e ajude-a a procurar ajuda profissional. Geralmente as vítimas têm medo de procurar ajuda, porém, com este apoio, talvez elas o consigam fazer.


publicado por araretamaumamulher às 11:39 | link do post | comentar | ver comentários (5) | favorito

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