Domingo, 10 de Janeiro de 2010
A complexidade da problemática da discriminação e da violência contra a mulher, envolvendo diferentes e significativos aspectos, não é recente, é uma questão milenar.
Diante dos instrumentos jurídicos contemporâneos e das inovações legais, tanto no aspecto interno, como internacional (global e regional), o presente estudo abordará situações concretas transformadas em decisões judiciais propondo as seguintes indagações: os mecanismos atuais de proteção à mulher são suficientes para promover a erradicação das discriminações e violências? Há necessidade de aperfeiçoar esses mecanismos? Quais os principais desafios a este processo? Quais os obstáculos? Quais as perspectivas e possibilidades?
À luz desses estudos, buscar-se-á enfocar possibilidades de otimização e perspectivas capazes de estimular o processo de erradicação da discriminação e da violência contra a mulher.
Os gregos conceberam a idéia ocidental de razão com um pensamento que segue princípios e regras de valor universal. Sendo assim, a razão é um traço de distinção da condição humana, bem como a capacidade de acúmulo de conhecimento e de transmissão do mesmo pela linguagem.
"Traz em si a superação dos mitos, dos preconceitos, das aparências, das opiniões sem fundamento. Representa, também, a percepção do outro, do próximo, em sua humanidade e direitos. Idealmente, a razão é o caminho da justiça, o domínio da inteligência sobre os instintos, interesses e paixões."
A essência humana se compõe de elementos racionais.
O ser humano tem a faculdade de escolher livremente os seus próprios fins, ou os objetivos a alcançar pela sua atividade. E isso só se realiza em virtude de outra característica essencial do homem, que é a razão axiológica ou capacidade de apreciação de valores éticos, utilitários, estéticos, religiosos, e de livre escolha entre eles. O ser humano é o único ser que vai dar conteúdo moral aos seus atos, é o único ser que vai valorar eticamente suas ações.
Neste contexto, a razão humana confunde-se com a própria dignidade humana inerente a todo ser humano, simplesmente por ser "ser humano". Seja qual for à condição da pessoa ela será titular de direitos, e os direitos humanos serão instrumentos de proteção à dignidade humana. Surge assim, uma universalidade de direitos voltada à proteção e garantia da dignidade humana. É a razão surgindo como fonte principal dos direitos humanos.
É possível afirmar que ao lado da razão humana, também caminha a ideologia, ou seja, aspectos ideológicos e culturais da sociedade em que o ser humano vive. Há uma interferência cultural em suas atitudes.
A universalidade traz a idéia de que os direitos humanos são universais, independentemente da nacionalidade do indivíduo. Considera a "condição de pessoa" como requisito mínimo para que a pessoa seja titular de direitos. Leva em consideração a dignidade humana.
Por outro lado, para o relativismo cultural a cultura é que vai ser a fonte primordial dos direitos humanos. A razão vai ser limitada ou eliminada em função de valores culturais. Tem-se aqui uma concepção de ser humano completamente determinado pelo meio. Uma modificação da cultura poderá causar danos temerários à própria identidade do indivíduo.
"Neste prisma, cada cultura possui seu próprio discurso acerca dos direitos fundamentais, que está relacionado às específicas circunstâncias culturais e históricas de cada sociedade. Neste sentido, acreditam os relativistas, o pluralismo cultural impede a formação de uma moral universal, tornando-se necessário que se respeite às diferenças culturais apresentadas por cada sociedade, bem como seu peculiar sistema moral."
Em alguns casos, quando há eliminação de qualquer resquício de razão, o relativismo cultural pode chegar a seu ponto máximo.
A título de exemplo caberia citar os grupos terroristas islâmicos, que em função de sua cultura, permitem que seus princípios culturais sejam levados às últimas conseqüências.
Também caberia citar as tribos do Kênia e da Somália, onde ainda hoje é comum a prática de mutilação genital feminina na transição da mulher para a vida adulta, cujo fundamento para tal prática é a inferioridade da mulher. É o uso do poder, da força para defender valores culturais. A cultura desses lugares chega a cegar essas mulheres ao ponto delas pensarem que não há no mundo mulheres que não sejam mutiladas.
Após séculos de determinadas práticas culturais desiguais, pode-se afirmar que os instrumentos internacionais de proteção dos direitos ainda têm muitos desafios pela frente.
Entende-se por violência contra a mulher "qualquer ação ou conduta, baseada no gênero, que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto no âmbito público como no privado", ao mesmo tempo em que elege a comunidade, os agentes do Estado e qualquer sujeito convivente nas relações interpessoais como sujeitos ativos dos atos de violência, demonstrando grande sensibilidade social e observação cuidadosa dos fatos que ocorrem com freqüência nas relações sociais latino-americanas.
Assim, entende-se como violência também aquela que tenha ocorrido dentro da família ou unidade doméstica ou em qualquer outra relação interpessoal, em que o agressor conviva ou haja convivido no mesmo domicílio, na comunidade e perpetrada por qualquer pessoa, na comunidade, local de trabalho, estabelecimentos educacionais de saúde ou qualquer outro lugar, e mesmo aquela perpetrada ou tolerada pelo Estado ou seus agentes onde quer que ocorra.
A violência contra a mulher é um assunto que precisa ser tratado com seriedade. Pois, trata-se de um fenômeno generalizado que não distingue raça, classe social ou religião. Recente estudo constatou que de cada cinco mulheres que faltam ao trabalho, uma o faz por violência doméstica. Em 1994 constatou-se que, de cada cem mulheres que morrem nesta situação, setenta morrem por causas advindas de violência doméstica. A principal causa de lesões contra as mulheres de 15 a 45 anos são agressões por parte de seus parceiros. Em 1998, constatou-se que, de 66,3 % dos acusados em homicídios contra mulheres eram seus próprios parceiros.
Pode-se dizer que os dados são alarmantes.
Os Tratados Internacionais de Direitos Humanos asseguram parâmetros protetivos mínimos. Só se aplicam no sentido de fortalecer, aprimorar e ampliar o grau de proteção dos Direitos Humanos no âmbito interno.
O sistema internacional de proteção dos direitos humanos pode apresentar diferentes âmbitos de aplicação. Assim, têm-se os sistemas global e regional de proteção aos direitos humanos.
A convivência global consolida-se pelos instrumentos das Nações Unidas, como a Declaração Universal de Direitos Humanos (1948).
No âmbito regional, no que tange ao assunto em questão, tem-se a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, conhecida como Convenção de Belém do Pará, adotada pela Assembléia Geral da Organização dos Estados Americanos em 06.06.1994, ratificada pelo Brasil em 27.11.1995.
Pode-se afirmar que tal Convenção foi corajosa ao tratar deste assunto, principalmente pelo fato de permitir a petição individual para assegurar direitos. O art. 12 dessa Convenção prevê o mecanismo das petições.
O que a fez se tornar a lei 11.340 Lei Maria da Penha, a meu ver uma das mais completas no mundo sobre o assunto.
Agora falta nos fazê-la ser cumprida a risca, colocarmos pessoas capacitadas para lidar com tão importante lei.
Faz-se necessário tecer algumas considerações sobre os direitos humanos sob uma perspectiva de gênero.
O gênero como objeto de proteção normativa deve atentar fundamentalmente para o fato que não é um dado ou um fato biológico, mas socialmente construído, uma vez que mesmo a percepção do sexo é interpretada, sendo culturalmente condicionado.
O discurso jurídico em atenção à perspectiva de gênero é um discurso que prima pelo respeito ao direito à diferença, que não significa desigualdade. Não se deve tratar a mulher promovendo desigualdades não autorizadas pela lei, mas percebê-la como sujeito especializado de direitos que têm por conteúdo não a diferenciação odiosa ou a defesa das minorias, mas a identidade.
A violência contra a mulher é um problema complexo que não se resolverá de forma simples. Encontrar soluções representa um enorme desafio para as mulheres em geral e para os demais segmentos da sociedade. Neste assunto, as políticas preventivas são fundamentais.
O combate à violência contra a mulher exige ações integradas em diversos níveis, áreas e instâncias. Não se pode combater a violência sem exigir o fim da impunidade.
Também é necessário conquistar a estabilidade dos órgãos de apoio, para garantir a continuidade das políticas públicas. Na educação faz-se fundamental as discussões sobre a igualdade de gênero e o combate às discriminações.
Enfim, a luta não pode cessar. As mulheres precisam seguir em frente contra os preconceitos, esteriótipos e tabus que a colocam numa condição de inferioridade e, dessa forma legitimam a violência.
É interessante neste estudo a transcrição de ementários de jurisprudências consideradas imprescindíveis neste processo de diminuição de desigualdade e de eliminação da discriminação.
É desnecessário um aprofundamento nas pesquisas para se constatar que a igualdade de gênero adotada por nossa Constituição Federal e por pactos internacionais aos qual o Brasil é signatário ainda tem pela frente um árduo caminho de lutas e transformações culturais para tornar-se realidade.
Como visto, são incontáveis os casos de violência praticada contra a mulher no Brasil, que é um país marcado por uma ideologia sexista que estigmatiza o gênero feminino.
Os efeitos perversos dessa tradição discriminatória se refletem nas mais variadas formas de violação dos direitos humanos da mulher: estupros, espancamentos domésticos, prostituição forçada, violência física e psicológica, etc., constituindo assim, numa forma de retrocesso às conquistas no âmbito dos direitos humanos.
O que falta para uma diminuição da desigualdade de gênero e da violência contra a mulher é uma maior efetividade para tais previsões legais, ou seja, que sejam cumpridas a despeito da cultura patriarcal ainda dominante em nosso país.
Mulheres vítimas de violência não podem se calar. Devem recorrer ao Poder Judiciário, a fim de que este aplique e execute dispositivos de direitos humanos, tanto aqueles contemplados diretamente pela legislação nacional, (Lei Maria da Penha) como outros resultantes da adesão do Brasil a tratados internacionais, em especial a Convenção da ONU sobre a Mulher e a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher.


publicado por araretamaumamulher às 14:16 | link do post | favorito

De jefhcardoso a 10 de Janeiro de 2010 às 19:19
Olá! Chamo-me Jefhcardoso e sempre que posso saio em visitas de blog em blog seguindo a setinha que diz próximo blog>>. Tenho a curiosidade de saber sobre as diversas faces da literatura de internet.
Neste blog que você segue eu encontrei coisas incríveis. Toda uma comunidade de leitores, pessoas que acompanham e comentam.

Posso lhe convidar a conhecer meu blog a fim de saber qual sua opinião sobre meus modestos escritos?

Meu blog é bem variado e essa face romântica está em desenvolvimento; ainda hoje postei sobre o amor.

Posso aguardar sua visita? (http://jefhcardoso.blogspot.com).


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