Segunda-feira, 25 de Janeiro de 2010
Há palavras como viúvas ou viúva que designam aquele ou aquela que sobrevive ao seu cônjuge; e há palavras como órfão para nomear a perda precoce de um dos genitores. “Mas para quem sobreviveu a um filho, não existe denominação alguma”.
Esta é uma perda avassaladora, origem na desunião e até na destruição do vínculo matrimonial, inclusive familiar.
Muitos especialistas têm discorrido sobre a perda, do ponto de vista psicológico; quanto às suas implicações, advindas da morte de um filho, estão longe de ser suficientemente tratadas. Imagino que isso se deva à angústia resultante de uma abordagem tão difícil, pois é de se esperar que os filhos sobrevivam naturalmente aos pais; no entanto, raramente se considera a possibilidade de acontecer o contrário.
Quando meu filho morreu, a minha vida foi de súbito destroçada, porque não “deveria ser assim”. Não posso aceitar ter sido mãe de um filho e de repente deixar de ser mãe desse filho.
A realidade dói tanto, e custa tal esforço aceitar esta realidade, que passei a resistir como posso, acreditando, por mais um lapso de tempo, que meu filho não morreu ainda, e passando a valer-me da negação, a fim de sentir que o meu filho continua com vida. A meu ver, em casos como este, a existência do filho fica inscrita para sempre na mente materna, pois se há de convir que um filho não seja uma pessoa a quem se conheça de imediato, como ao restante das outras: a um filho se reserva um espaço todo especial na mente e no coração, desde que os pais planejam a sua concepção e, a partir dela, toda a sua existência.

Eu planejava como deveria ser a vida do Vinicius, o futuro, planejava o que fazer para que ele continuasse estudando, uma semana antes dele morreu eu e ele planejamos seu aniversario, a, mas nunca fui capaz de conceber como deveria ser seu funeral. Isto porque basicamente nós, seres humanos, enquanto vivemos deixamos a morte de fora. Para nós nem toda morte nos diz respeito, só se torna real quando acontece conosco, em nossas vidas, e o que mais assusta é que ela aparece sem pedir licença, irrompendo na vida da gente; mas a morte, que não queremos admitir, já estava presente e nos acompanha continuamente.
Há muita nostalgia nisso tudo, há uma mistura de sofrimento, amor e proveito. Sofre-se a ausência do que se foi, e se consola oferecendo a dor causada pela sua ausência. Continuar sofrendo é uma tentativa de manter vivo esse filho. Parece-me que, ainda que eu escrevesse um tratado completo sobre a experiência de se perder um filho, não seria suficiente para chegar a compreender o que estou vivendo; talvez as pessoas possam se aproximar da minha experiência, entender o que penso e como me afeta; mas quando falo da minha solidão e do meu vazio, continuo incompreensível para todos, porque solidão e vazio são palavras que cobrem precisamente essa falta. E essa ausência continuará a se fazer presente.
Na realidade, serve apenas para vislumbrarmos a essência humana e nos tornarmos conscientes de que, muitas vezes, se não estamos dispostos a encarar a morte, é porque o amor causa dor, e só quando se sofre é que se sente medo de perder a pessoa amada.
Quem vive a perda não volta a ser a pessoa que era antes, porque a morte altera valores e hábitos.
É importante falar da morte, mesmo ela deixando uma marca profunda na vida de quem fica', descobri que não existe, em nenhum idioma, uma palavra para definir a morte de um filho. 'É uma dor que não tem nome, algo que não se espera. '
Perder um filho subverte uma ordem cronológica e, por muito tempo, perguntei: 'Por que ele e não eu? Senti uma dor física, a garganta seca, um aperto em todo o corpo. É muito difícil lidar com essa realidade.
Por uns três meses, vivi digerindo a morte, tentando entender a razão da tragédia, a interrupção da vida dessa maneira.
A morte do Vinicius mudou duas coisas em mim. A primeira é que hoje penso que morrer não deve ser tão abominável, apesar de não ter nenhuma tranqüilidade para afirmar que um dia ainda vou encontrá-la. Ainda assim, a morte me parece menos terrível, ou melhor, algo bem possível, e talvez até esperado. Por outro lado, acho que tenho o compromisso de conduzir minha vida da melhor forma possível. Nossa função como pais é dar condições para que cada um de nossos filhos siga o seu próprio caminho. '
E eu ainda tenho a Amanda e Neto, então mesmo com um vazio enorme dentro do peito tenho a obrigação de continuar.
Hoje resolvi postar esse assunto, porque esse foi talvez o mês mais difícil para mim, no dia 11 de janeiro fez um ano que o Vi morreu, e no dia 16 de janeiro ele completaria 18 anos, só de escrever isso eu sinto o total absurdo da situação... Meu Deus meu filho não viveu nem 18 anos? Por quê? Por quê?


publicado por araretamaumamulher às 10:20 | link do post | favorito

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